9 Crimes - Damien Rice

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Amores de Final de Ano

O que te trazes aqui? Fermentação cuspida? Já não faz mais sentido tuas palavras, alusivas.
Cavando, cavando...?
Mas tudo tira o foco. Tudo tira a alma.
Tudo tira!!
Que ordem é essa? Ou não é ordem?
Não é!
Ah, não é...
Não é de Não ser.
De ser sem nunca ser.
De pegar, e no entanto, cuidar não estar pegando.
O homem de barba branca no papel machê? Rasga!
Busca dentro qualquer conteúdo que não as mesmas coisas anuais.
Meias...
Cega-me as luzes do pinheiro de natal,
mas cega-me mais ainda tua presença abusiva!!
A perturbar-me nesse natal rançoso.
Que mesmo de mansinho, anuncia um colapso incompreensível.
Pisco os olhos para não ver-te. Mas tu já és o próprio pinheiro!!
Poéme. Desde quando nossas relações tornaram-se assim?
Juro que perdi esse momento cometido por mim mesma.
Por mim mesma.
O desapego nas expressões contidas. No ás vezes planejado.
No amor sob medida.
Na vida não vivida?
Na cautela da alma calejada..
Que acredita estar sendo comedida, mas só acredita.
E anuncia na canção natalina
Que uma vez que mergulha, afunda.

Malditos amores de final de ano,
Que ao invés de viajar como todo mundo,
faz-se presente quando mais ninguém está.

25/12/13

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A Carta de Marius à Cosette

"A redução do universo a uma única criatura, a dilatação de um único ser até Deus, eis o amor.
O amor é a saudação dos anjos aos astros.
Como a alma é triste quando sua tristeza provém do amor!
Que vazio é a ausência do ser que sozinho encheria o mundo! Oh! como é verdade que o ser amado se transforma em Deus. É fácil compreender como Deus sentiria ciúme se o Pai de todas as coisas não tivesse evidentemente feito a criação para a alma, e a alma para o amor.
Basta um sorriso entrevisto ao longe sob um chapéu de tule branco e coifa lilás, para que a alma entre no paraíso dos sonhos.
Deus está por trás de tudo, mas tudo a Deus esconde. As coisas são negras, as criaturas são opacas. Amar alguém é torná-lo transparente.
Certos pensamentos são verdadeiras preces. Há momentos em que, seja qual for a atitude do corpo, a alma está de joelhos.
Os amantes separados iludem a ausência por mil e uma quimeras que têm no entanto a sua realidade. Impedem-nos de se verem, interceptam-lhes as cartas; eles porém encontram meios misteriosos de se corresponderem: pelo canto dos passarinhos, o perfume das flores, o riso das crianças, a luz do sol, os suspiros do vento, o brilho das estrelas, a criação inteira. E por que não? Todas as obras de Deus são feitas para servir o amor. O amor é bastante poderoso para encarregar toda a natureza de levar-lhe as mensagens.
Ó primavera! Você é a carta que eu lhe escrevi.
O futuro pertence bem mais aos corações do que aos espíritos. Amar, eis a única coisa capaz de ocupar e encher a eternidade. Ao infinito convém o inesgotável.
O amor participa da própria alma. Tem a mesma natureza que ela.
Como a alma, é uma fagulha divina; como a alma, é incorruptível, indivisível, imperecível. É um ponto de fogo que está em nós, que é imortal e infinito, que nada pode limitar ou extinguir. Nós o sentimos queimar até a medula dos ossos e o vemos brilhar até a imensidão dos céus.
Ó amor! adorações! prazer de dois espíritos que se compreendem, de dois corações que se confundem, de dois olhares que se penetram! Não é verdade que os hei de ter — ó felicidade! — passeios a dois na solidão, dias abençoados e brilhantes! Às vezes chego a pensar que, de quando em quando, algumas horas se destacam da vida dos anjos e vêm até o mundo para atravessar o destino dos homens. Deus nada pode acrescentar à felicidade dos que se amam senão tornando-os eternos. Depois de uma vida de amor, uma eternidade de amor é com efeito um acréscimo; mas aumentar em sua própria intensidade a felicidade inefável que o amor dá à alma desde este mundo, isso é impossível, mesmo a Deus. Deus é a plenitude do céu; o amor é a plenitude do homem.
Contemplamos uma estrela por dois motivos: porque é luminosa e porque é impenetrável; e, no entanto, temos ao nosso lado um brilho mais suave e um mistério maior ainda, a mulher.
Todos nós, quem quer que sejamos, temos a necessidade de respirar. Se nos falta o ar, ficamos sufocados e morremos. Morrer por falta de amor é horrível. É a asfixia da alma.
Quando o amor fundiu e unificou duas almas, numa unidade angélica e sagrada, foi que ambas encontraram o segredo da vida; não são nada mais que os dois termos de um mesmo destino, as duas asas de um mesmo espírito. Amem, flutuem! No dia em que uma mulher, passando à sura frente, iluminar o seu caminho, você está perdido: é o amor. Então, só lhe restará uma coisa: pensar nela tão fixamente que ela se veja constrangida a pensar em você.
O que o amor começa não pode ser acabado senão por Deus.
O verdadeiro amor se desola e se encanta por uma luva perdida ou por um lenço encontrado, e precisa de uma eternidade para sua dedicação e esperanças. Ele se compõe, ao mesmo tempo, do infinitamente grande e do infinitamente pequeno. Se você é pedra, seja ímã; se é planta, seja sensitiva; se é homem, seja amor.
Para o amor, é bastante. Termos a felicidade, queremos o paraíso; temos o paraíso, queremos o céu.
Vocês que tanto se amam, tudo isso está no amor. Saibam encontrá-lo. O amor tem tanta contemplação como o céu, e mais do que o céu, tem o prazer.
- Ela ainda vem ao Luxembourg? – Não, senhor. – É nesta igreja que ela ouve a missa, não é? – Eles não aparecem mais por aqui. – Ela ainda mora nesta casa? – Não; mudou-se. – Para onde? – Ela não disse.
Que tristeza não se saber o endereço da própria alma!
O amor tem infantilidades, as outras paixões têm mesquinhez. Vergonha às paixões que tornam o homem mesquinho! Honra àquela que o faz criança!
É uma coisa estranha, sabem? Eu vivo na noite. Há alguém que, ausentando-se, levou consigo o céu.
Oh! jazer um ao lado do outro no mesmo túmulo, de mãos dadas, e de quando em quando, nas trevas, acariciar docemente um dedo; isso bastaria para a minha eternidade.
Vocês que sofrem porque amam, amem mais ainda. Morrer de amor é viver.
Amem . A esse suplício alia-se uma sombria e estrelada transfiguração.
Há êxtase na agonia.
O alegria dos passarinhos! Eles cantam porque têm um ninho.
O amor é uma respiração celeste do ar do paraíso.
Corações profundos, espíritos sábios, recebam a vida como Deus a fez. É uma longa prova, uma preparação, ininteligível para um destino desconhecido. Esse destino, o verdadeiro, começa para o homem no primeiro degrau que desce para o túmulo. Só então lhe aparece alguma coisa, e ele começa a distinguir o definitivo. O definitivo, pensem nessa palavra. Os vivos vêem o infinito; o definitivo só se deixa ver pelos mortos. Enquanto isso, amem e sofram, esperem e contemplem. Desgraçado de quem não tiver amado senão os corpos, as formas, as aparências! A morte roubar-lhe-á tudo. Procurem amar as almas, e tornarão a encontrá-las.
Encontrei pela rua um jovem muito pobre que amava. Seu chapéu estava velho, a casaca muito usada com os cotovelos rotos; a água passava através de seus sapatos e os astros através de sua alma.
Que grande coisa ser amado! Maior ainda é amar! O coração torna-se heróico à força da paixão. Ele não se compõe mais senão de pureza; não se apóia senão no que é nobre e grandioso. Um pensamento indigno nele pode germinar tanto quanto uma urtiga no gelo. A alma alta e serena, inacessível às paixões e às emoções vulgares, dominando as nuvens e as sombras deste mundo, as loucuras, as mentiras, os ódios, as vaidades, as misérias, mora no azul do céu, e não sente senão os abalos profundos e subterrâneos do destino, como o alto das montanhas sente os tremores de terra.
Se não houvesse quem amasse, o sol se extinguiria”.



Victor Hugo em Os Miseráveis - pág. 826,827,828

domingo, 20 de janeiro de 2013

"Meus amores", por uma qualquer 3 - ato final

Me casei duas vezes. Minha primeira mulher fora a mulher da minha vida. A perdi para outra. Ela julgou-me que não era boa o suficiente para ela, mas a outra também não fora. Nem a outra, nem a outra...
Sofri por ela. Fui eu quem mais lutei contra essa sua doença, enquanto ela não parecia fazer esforços para mudar. Apesar de tudo, ela foi a mulher mais encantadora que eu conheci. Era uma boa moça que se perdeu na vida, vítima da sua insatisfação. Um desperdício. Nunca compreendera que tinha o suficiente. Nunca fora feliz, para ela. Era linda, mas achava-se feia. E o tempo a tornou tudo o que pensava ser.
Vive sozinha em sua pequena ilusão.
No fim não sabe - como poderia? - mas vai ver é isso que a satisfaz: ser insatisfeita.
A segunda foi um erro de quem não aprende. Na verdade, é um erro chama-la de erro, mas é igual a todas as mulheres que conheci.
Apesar de tudo, não me incomoda. Já fomos muito apaixonadas, construímos muitas coisas.
Viver ao lado dela não é bom, nem é ruim. Viver ao lado dela é viver ao lado dela. E prefiro assim. Agora no fim da vida não tenho mais ânimo e não tenho mais alma para procurar e viver um novo amor.
Isso é privilégio da juventude. De quem ainda tem muito que machucar-se para celebrar poucos instantes de amor. E no final descobrir que nada sabe, nada valeu, nada viveu.